quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Happy birthday my friend!


 
a vida nos atravessa
numa esquina que surge do nada
e nos coloca diante de outra alma
e sem que se perceba
mesmo que cada alma siga uma via
em direções opostas na encruzilhada
carregam um ao outro por todo sempre
porque quando é amizade de alma
é perene


 

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Truque

 
e essa ordem que tudo rege no planeta
os átomos, os códigos, as senhas
tudo tão rigorosamente orquestrado
eliminando da teoria o capítulo dos acasos
me enlouquecendo com tantos argumentos
como se o óbvio fosse óbvio mesmo
se tudo segue um rito, um ritmo
uma cadência perfeita de sequências
onde a lógica se intitula a regente
e afirma dura e categoricamente
que o amor é apenas bioquímica
 
por que então fico eu aqui na soleira
olhando o abismo que no horizonte se desenha
se foi você quem disse que me amava?
por que fico eu esperando que um toque
leve embora a tua ausência?
por que o ônus de me sentir amada
me faz desse sabor tão viciada?
prisioneira sem algemas, 
dolorosamente livre de corpo e alma
para não ser nem tua, nem de mais ninguém
se eu nunca disse que te amei?
 
 
 

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Dona de nada

 
 
seria hoje ou nunca
ela preferia que fosse nunca
mas enquanto ela regava os vasos
ele saltava os muros
 
enquanto ela cosia botões
sonhava com os novos armários
guerreava com seu cabelo rebelde
ele simplesmente não voltava pra casa
 
e quando voltava, não era ele
o mesmo corpo, o mesmo rosto, a mesma boca
até a voz era igual, impressionante!
mas lá estava, os olhos lhe denunciavam
 
e dentro do seu coração gritava, impostor!
mas ele mansamente lhe tomava e esperançosa, ficava
até o dia em que descobriu que ele era um gato
então entendeu que ele sempre seria fiel a si mesmo



sexta-feira, 2 de outubro de 2015

O que vejo?



o mesmo, o efeito
o jeito, sem jeito
o compasso, sem passo
a lua, nublada
 
o visto, sem risco
o contorno, quadrado
o lado, de fora
o salto, sem alto
 
uma aposta, um tiro
uma vaia, risos
uma palavra, abrigo
 uma fita, enigma
 
o disfarce, sigilo
o amor, embutido
o sorriso, vazio
o lacre, intacto
 
o drama, vivido
os nós, apertados
a estrada, no mapa
os sonhos, dormidos
 
o medo, estorvo
os pés, ancorados
o futuro, em jaula
e a chave, guardada

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Vento

 
eu sei que você nasceu para ser vento
que o azul que sai dos teus dedos
que no papel segreda os teus erros
é o nanquim mais nobre deste mundo
 
 desejo solitário, impuro de tantos excessos
que busca sossego em meio ao caos
o teu silêncio, na rua, em horário de pico
a tua rima lá no céu, tal o sol e a lua
 
és vento que chega manso
 como são os ventos mornos
quase não notei o contorno
 o laço em volta do corpo
nem quando foi derradeiro adeus
 tão suave foi o abandono



quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Sete luas

 
 
você que só vê os meus excessos
o que transbordo só quando quero
de nada sabe sobre o meu silêncio
que nem sob a lupa se desvenda
o que eu soterrei sob sete luas
 
hoje meu oceano é feito de asfalto
e os meus sonhos medidos em palmos
e nas cicatrizes tatuo flores e vertigens
dores e amores, sinônimos ímpares
canções e versos que só eu ouço e rimo
 


terça-feira, 30 de junho de 2015

Poetar com a vida

 
 
dizem que o poeta feliz se cala
eu acho que ele vira abelha, troca rimas por saliva
versos doces por beijos verdadeiros
 
o poeta sobrevive do abstrato
das travessias que faz entre os mundos
e das sensações que traz dessas viagens
 
o bom poeta é apenas um solitário
alguém que escreve pedidos de socorro
mas não sabe a quem os destinar
 
eu já não sou poeta
o mar já não é uma vírgula, pus fim ao eufemismo
mas ainda gosto das fantasias...
 
 

terça-feira, 23 de junho de 2015

James Horner


 
ainda que as árvores se despojassem de suas folhas
que das flores não exalasse mais nenhum perfume
que toda gota d'água se evaporasse dos oceanos
que o mundo inteiro se desbotasse de suas cores
você nos faria habitar no paraíso, só com sua música
 
em cada nota minuciosamente pendurada no varal
um toque do seu gênio, outro de quem te fez
 navegador de todos os mares, timoneiro das embarcações
guardião das chaves e anfitrião dos melhores salões
o dom e a partilha, que tão cedo ao lar retorna
 

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Oceana-me

 
você é um mapa sem estradas
um roteiro que não pode ser escrito
humano e divino tal o som de um piano
que faz com que me perca o tempo todo
a medida em que acho o que procuro
 

você é o contraste que me fazia falta
a luz que faz mais bela a sombra e realça o foco
 é um destino certo mesmo que em porto incerto
que me leva num barco à deriva conduzido pela lua
a mais nobre timoneira dos amantes nestes oceanos
 
 


segunda-feira, 25 de maio de 2015

Porão

 
imagino quão vazios sejam os teus porões
com quanto silêncio apedrejou os teus medos
para ostentar agora essa figura tão descolada
sem necessidade nenhuma de amar e ser amado
 
imagino quantas vezes se evitou olhar ao espelho
fez a barba de qualquer jeito
 penteou com os dedos o cabelo
guardou na garganta todos os amargos
 
e deu bom dia a ela forçando um sorriso
observando a casa que ela esqueceu, desabotoada
enquanto se recordava da noite em que ela
escorreu da sua cama para o quarto ao lado
 
e ela seguiu todas as manhãs lendo os noticiários
para ofuscar o desconforto de um diálogo
e você aprendeu a escrever poemas
que joga pela janela, feito iscas no anzol
 
e o que deveria te salvar, te escraviza ainda mais
põe nesses poemas tudo o que tem a lhe dizer
e covardemente dedica às tuas vítimas inocentes
despertando novos amores...em vão
 
não vai além, nem sai de onde está, de fato não quer
escreve teus gritos em versos, algema-os no papel
ela sabe que tudo o escreve é dela, mas te espera
quer ser eleita a única da tua vida, quando já é
 
tenho pena do silêncio
do perdão que não chega
das palavras que não se fazem chaves
dos pensamentos que não se expelem
das bocas que não se amam
dos corpos que não se entregam
das chamas que não se apagam
mas que se deixam soterrar pelo cotidiano...
 

segunda-feira, 30 de março de 2015

Até quando fênix?

 
você diz um querer
mas tropeça nas tuas vontades
à luz deixa aquecer os teus olhos
mas nas sombras oculta vícios teus
 
na ponta da língua nascem muitos versos
nos atos, simplesmente o inverso
sopra o vento do norte, anuncia o céu
sopra o vento do sul, o inferno que vem
 
e eu ando com o meu coração
de um lado a outro, procurando repouso
vivendo um dia de cada vez
morrendo e renascendo quantas vezes puder
 
 

terça-feira, 10 de março de 2015

Sobre os amores que não são


É chuva de verão
que inunda o mundo num repente
alterando o cenário emoldurado pela janela
que faz reviver todas as células
sedentas desta água benta

quisera chover eternamente
encher lagoas e construir oásis
mas é chuva tão passageira
mal chega a refrescar a pele
antes a deixa mais com sede

e nos tempos de seca, que saudade
imaginar as gotas dedilhando a carne
magistralmente como Ludovico Einaudi
não sei como pode ficar assim na memória
o que para alguém nem sequer teve nome

sábado, 28 de fevereiro de 2015

Ritos


beija-me antes que seja hora de partir
antes que desapareça o brilho das estrelas
antes que eu recupere a minha prudência
e comece a ponderar os prós e os contras

tem coisas que a matemática não alcança
tem forças que confundem as respostas
e subtraem das perguntas qualquer lógica
tem horas que o silêncio traduz tantos gritos

beija-me antes que viremos amigos
antes que você perceba que eu rio à toa
de todas as tuas piadas, até mesmo quando se cala
antes que o óbvio venha à tona

não finja que não deseja o mesmo que eu
você não estaria comigo, numa noite de sábado
me ouvindo falar do meu tolo cotidiano
que eu tento florear mais que os vasos da varanda

então, beija-me
pare de falar, pare de evitar
esse beijo que já aconteceu no nosso desejo
desde o momento em que eu te abri a porta




terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Arbítrio

 
e se tudo foi um engano
se fomos vítimas de um encanto de sereia
ou da miopia de um velho cupido
 
e se estamos ainda entramados
por não saber como nos livrar desses versos
que nos receita o amor como remédio
 
e se eu deveria te deixar ir
e tapar os meus olhos para o teu destino
e apagar atrás de mim, o meu rasto
 
mas se você quiser ficar, que fique direito
você será sempre livre, para me amar
como também é livre para não ser meu
 
o arbítrio é o que pende o fio do equilíbrio
é o que move agulha da bússola e aponta os rumos
é o sol que dissipa as brumas das incertezas
 
 

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Replay

 
 
às vezes eu só preciso que você acredite em mim
 como um último fio que não se desfaz
quando a corda no penhasco parece se romper
como uma vírgula que confunde os pontos finais
unindo argumentos, sem terminar as frases
como um risco que reinicia a melodia do vinil
quando a agulha desliza sobre as derradeiras linhas
eu te peço, olhe para mim, em mim
não temos outro lugar comum que em 'nós'
singular composto de nós, cegos laços
acredite em mim, replay baby
vezes e vezes, sem fim
 
 

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Birra

 
 
o relógio quebrado me desliga do óbvio
o fluxo interrompido das horas jorra o silêncio
lá fora tudo não passa de vento e intervalo
mais do mesmo que resulta num punhado de nadas
postes seguram lamparinas, mesmo quando estão frias
o amor que ora dilacera o peito, outrora remenda feridas
 
o faz de conta é um artifício paliativo, passatempo
retém os medos por trás dos frouxos sorrisos
tão falsos quanto os diamantes de acrílico
lentamente escorrego pelo dia, esvaindo em sonhos
pedidos de socorros inaudíveis, porém nunca ditos
teimosamente enterrados, sob sete palmos de argumentos